RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

 

JOÃO CÂNDIDO FELISBERTO

UM GAÚCHO POUCO LEMBRADO




Na segunda noite de desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro a Paraíso do Tuiuti, penúltima agremiação a desfilar, trouxe como enredo Glória ao Almirante Negro!, uma inspiração na história do gaúcho João Cândido Felisberto, que se destacou como líder no movimento de militares da Marinha contra castigos físicos sofridos dentro de navios, que persistiam mesmo após o fim da escravidão. A escola apresentou o personagem em diferentes fases, passando pela infância, pela ascensão como marinheiro e pela traição. João Cândido liderou a chamada Revolta da Chibata. Um dos destaques foi o entregador Max Ângelo dos Santos, que foi vítima de xingamentos racistas e foi agredido por uma mulher em 2023. 

O que muitos por aqui não sabem, ou não reconhecem, é o valor histórico deste marinheiro nascido em Encruzilhada do Sul e de lá saindo somente aos 18 anos para incorporar-se a Marinha Brasileira (existe um busto de João Cândido nesta cidade - No Rio de Janeiro há uma estátua em sua homenagem). 

 O QUE FOI A REVOLTA DA CHIBATA  

A Revolta da Chibata ficou conhecida por ter sido um motim realizado pela insatisfação dos marujos brasileiros com os castigos físicos que sofriam na Marinha brasileira no começo do século XX. O castigo físico em questão era a chibatada, praticada pela Marinha contra todos os marujos que violassem as regras da corporação.

O uso da chibatada como forma de punição era uma característica que a Marinha brasileira havia herdado da Marinha portuguesa do período colonial a partir de um código conhecido como Artigos de Guerra. Essa forma de punição era dedicada somente aos postos mais baixos da Marinha, ocupados, em geral, por negros e mestiços.

A insatisfação dos marujos com os castigos físicos e com o rigor da Marinha era crescente. Relatos contam que, pouco antes da revolta, durante uma viagem nas proximidades da costa chilena, os marujos haviam demonstrado insatisfação com a punição dedicada a um marujo. O estopim para o início da revolta ocorreu quando Marcelino Rodrigues Menezes foi punido com 250 chibatadas sem direito a tratamento médico.

Além disso, há de se considerar que os contatos dos marujos com estrangeiros também fortaleceram essa insatisfação se considerarmos que Marinhas de outras nações não possuíam a mesma prática (de castigar fisicamente) com os marujos. Também se deve considerar que, cerca de um ano antes da revolta, o líder do motim, João Cândido, havia estado na Inglaterra e tido conhecimento dos acontecimentos do Encouraçado Potemkin, em que marujos russos rebelaram-se contra o governo de seu país.

Sobre a Revolta da Chibata, é importante considerar que ela não foi fruto apenas da insatisfação dos marujos com os castigos físicos. Os marujos, em geral, eram originários de famílias pobres, que sofriam com a desigualdade social existente na Primeira República. Assim, a Revolta da Chibata é considerada pelos historiadores também como uma revolta contra a desigualdade social e racial existente tanto na Marinha como na sociedade como um todo.

Penso que a sociedade gaúcha que busca com justiça a igualdade social e racial deveria reverenciar um pouco mais este importante líder histórico que posteriormente foi traído, aprisionado e morreu no ostracismo. 
     

Marujos amotinados no navio Baia, liderados por João Cândido,
apontaram os canhões para a cidade do Rio de Janeiro