REVOLUÇÃO DE 1923 - PARTE IV
Os Bandoleiros de 23
O idealismo e o desprendimento
foram características que marcaram o movimento revolucionário de 23, que
pretendia, em síntese, eliminar o abuso de poder político no Rio Grande do Sul.
Dos galpões, das faculdades, das estâncias e dos gabinetes levantou-se um grito
uníssono de revolta. Reuniram-se com a mesma finalidade advogados, médicos,
farmacêuticos, engenheiros, comerciantes, fazendeiros, empregados, peões
tropeiros. Borges chamou-os de bandoleiros – designação que os revoltosos
adotaram com orgulho. Estavam lado a lado representantes da aristocracia
cultural, das famílias mais tradicionais e o gaúcho simples e inculto do
interior. Não havia indiferentes. Ciosos de seus deveres e de seus direitos,
reivindicavam a prerrogativa de viver dentro das normas do sistema democrático,
“em harmonia com o destino da Pátria Grande, em que não só geográfica como
politicamente, deve estar integrado o Rio Grande do Sul.”
Os revolucionários quase não
dispunham de armamento, munição e equipamento. O meio normal de transporte era
o cavalo. Alguns tinham adagas, boleadeiras, revólveres; outros possuíam
Winchesters, Comblains, Mannlinchers e armas de cartucho para caça. Organizavam
piquetes com lanças de madeira de lei, havendo poucos que usavam espada. Não
poderiam contar com a vitória sem o auxílio federal, vagamente prometido.
Procuraram criar condições para a intervenção federal, lutando contra as tropas
da Brigada, bem instruídas e armadas comandadas pelo Coronel Emílio Massot. Era
uma espécie de ressurgimento do "quixotismo consciente" que os levara
ao campo da luta tantas vezes.
Não lhes sobrava outra tática
senão a da guerrilha rural; era preciso fustigar as tropas borgistas, evitando
o cerco e o combate decisivo. As diversas formações (tropas, grupos, colunas,
brigadas e divisões) atuavam de forma independente.
As tropas borgistas eram dotadas
de fuzis Mauser e de metralhadoras pesadas. Pouco antes do início da revolução,
Borges de Medeiros encarregara o Intendente de Uruguaiana, José Antônio Flores
da Cunha, da compra de 400 fuzis Mauser e 120 mil cartuchos calibre 7,65 na
Argentina, para complementar a já existente. A estrada de ferro estadual
(RVFRGS) transportava as tropas legalistas e a Brigada de Oeste, de Flores da
Cunha, chegou a empregar coluna motorizada na procura de contato com as tropas
de Honório Lemes. Em todos os quadrantes do Rio Grande o governo organizara
brigadas e forças provisórias para cooperar com a força estadual – a 1ª
Brigada, ao norte comandada pelo General Firmino de Paula, com seis corpos, a
4ª, no nordeste, comandada pelo Coronel Firmino Paim Filho, com seis corpos, a
3ª, no sul, do Coronel Juvêncio Lemos, com quatro corpos, no centro a do
Coronel Claudino Nunes Pereira, a 5ª, com seis corpos, e a oeste a 2ª,
comandada pelo Coronel José Antônio Flores da Cunha, com o 2º Regimento de
Cavalaria da Brigada Militar e com os Fronteiros da República, a cinco corpos.
Além das brigadas havia vários corpos provisórios e isolados: o de São Borja,
comandado pelo Dr. Getúlio Vargas; o de Osório, pelo Tenente-Coronel Alfredo
Weber; o de São Luís, pelo Tenente-Coronel Raimundo Neto; e o de Guaporé, pelo
Tenente-Coronel Paula Feijó.
Embora animados pelo mesmo
espírito de luta de 93, os bandoleiros de 23 portaram-se como civilizados. A
prática da degola e os lemas castilhistas de "quem não é amigo é
inimigo" e "ao adversário não se poupa, nem bens nem pessoa",
não foram aplicados. As tropas revolucionárias respeitavam os bens e as
famílias dos adversários e as amizades pessoais sobrepujaram as diversidades
ideológicas. Os revoltosos repetiam as audazes façanhas guerreiras de seus
antepassados, sem se mancharem em desmandos e atrocidades.
As tropas federais mantiveram-se
neutras. Às vezes alguns oficiais ou sargentos do Exército imiscuiam-se nos
confrontos, mas não passaram de casos isolados.