RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA
A tomada da Ponte da Azenha, do pintor Augusto Luiz de Freitas (Instituto de Educação General Flores da Cunha, Porto Alegre/RS)

segunda-feira, 3 de abril de 2023

 

REVOLUÇÃO DE 1923 - PARTE IV

Os Bandoleiros de 23


 

O idealismo e o desprendimento foram características que marcaram o movimento revolucionário de 23, que pretendia, em síntese, eliminar o abuso de poder político no Rio Grande do Sul. Dos galpões, das faculdades, das estâncias e dos gabinetes levantou-se um grito uníssono de revolta. Reuniram-se com a mesma finalidade advogados, médicos, farmacêuticos, engenheiros, comerciantes, fazendeiros, empregados, peões tropeiros. Borges chamou-os de bandoleiros – designação que os revoltosos adotaram com orgulho. Estavam lado a lado representantes da aristocracia cultural, das famílias mais tradicionais e o gaúcho simples e inculto do interior. Não havia indiferentes. Ciosos de seus deveres e de seus direitos, reivindicavam a prerrogativa de viver dentro das normas do sistema democrático, “em harmonia com o destino da Pátria Grande, em que não só geográfica como politicamente, deve estar integrado o Rio Grande do Sul.”

Os revolucionários quase não dispunham de armamento, munição e equipamento. O meio normal de transporte era o cavalo. Alguns tinham adagas, boleadeiras, revólveres; outros possuíam Winchesters, Comblains, Mannlinchers e armas de cartucho para caça. Organizavam piquetes com lanças de madeira de lei, havendo poucos que usavam espada. Não poderiam contar com a vitória sem o auxílio federal, vagamente prometido. Procuraram criar condições para a intervenção federal, lutando contra as tropas da Brigada, bem instruídas e armadas comandadas pelo Coronel Emílio Massot. Era uma espécie de ressurgimento do "quixotismo consciente" que os levara ao campo da luta tantas vezes.

Não lhes sobrava outra tática senão a da guerrilha rural; era preciso fustigar as tropas borgistas, evitando o cerco e o combate decisivo. As diversas formações (tropas, grupos, colunas, brigadas e divisões) atuavam de forma independente.

As tropas borgistas eram dotadas de fuzis Mauser e de metralhadoras pesadas. Pouco antes do início da revolução, Borges de Medeiros encarregara o Intendente de Uruguaiana, José Antônio Flores da Cunha, da compra de 400 fuzis Mauser e 120 mil cartuchos calibre 7,65 na Argentina, para complementar a já existente. A estrada de ferro estadual (RVFRGS) transportava as tropas legalistas e a Brigada de Oeste, de Flores da Cunha, chegou a empregar coluna motorizada na procura de contato com as tropas de Honório Lemes. Em todos os quadrantes do Rio Grande o governo organizara brigadas e forças provisórias para cooperar com a força estadual – a 1ª Brigada, ao norte comandada pelo General Firmino de Paula, com seis corpos, a 4ª, no nordeste, comandada pelo Coronel Firmino Paim Filho, com seis corpos, a 3ª, no sul, do Coronel Juvêncio Lemos, com quatro corpos, no centro a do Coronel Claudino Nunes Pereira, a 5ª, com seis corpos, e a oeste a 2ª, comandada pelo Coronel José Antônio Flores da Cunha, com o 2º Regimento de Cavalaria da Brigada Militar e com os Fronteiros da República, a cinco corpos. Além das brigadas havia vários corpos provisórios e isolados: o de São Borja, comandado pelo Dr. Getúlio Vargas; o de Osório, pelo Tenente-Coronel Alfredo Weber; o de São Luís, pelo Tenente-Coronel Raimundo Neto; e o de Guaporé, pelo Tenente-Coronel Paula Feijó.

Embora animados pelo mesmo espírito de luta de 93, os bandoleiros de 23 portaram-se como civilizados. A prática da degola e os lemas castilhistas de "quem não é amigo é inimigo" e "ao adversário não se poupa, nem bens nem pessoa", não foram aplicados. As tropas revolucionárias respeitavam os bens e as famílias dos adversários e as amizades pessoais sobrepujaram as diversidades ideológicas. Os revoltosos repetiam as audazes façanhas guerreiras de seus antepassados, sem se mancharem em desmandos e atrocidades.

As tropas federais mantiveram-se neutras. Às vezes alguns oficiais ou sargentos do Exército imiscuiam-se nos confrontos, mas não passaram de casos isolados.