BATEU SAUDADES
Meu filho deixou "as casas",
achou por bem ir embora
e no singrar da aurora
com esforço bateu asas.
Na malinha velha e rasa
juntou sua roupa singela.
Atravessou a cancela,
olhou, por fim, para trás
e lá se foi meu rapaz...
Eu vi tudo da janela.
Deixou aqui suas lembranças,
seu cavalo, seu cachorro
e já no segundo morro
se sumiu o meu confiança,
o meu guri, minha herança
de sangue, honra e sequência
mas levou junto a essência
do que podemos lhe dar
o amor fraterno de um lar
e o respeito querência.
Na verdade havia um tempo
que ele pensava nisto,
camperear algum serviço
que lhe provesse o sustento
pois ninguém vive do vento
soprando nos tarumãs.
Com cheiro de picumã
encroado na camisa
se foi, cruzando divisas,
sem saber do amanhã.
Essas terras não são mais
como eram antigamente,
campos vastos, com vertentes
recortando os pastiçais.
O labor dos ancestrais,
(assim contam e assim é),
uns herdeiros de má-fé
transformaram tudo em nada,
hoje resta uma invernada
que a gente cruza de a pé.
Mas vão ficar os floreios,
as gauchadas terrunhas
derrubando touro a unha
num pelado de rodeio.
Nunca teve tempo feio
quando junto de meu filho.
Agarrador num lombilho,
dava gosto, na lavoura,
ver descer foice em vassoura
para abrir um espinilho.
Ele foi, nós continuamos
qual pinheiros centenários
a cumprir este fadário
de aguentar os minuanos.
Gente humilde, interioranos
labutando nesta vida
de uma maneira sofrida
pois os sonhos, os desejos
esvoaçam quando vejo
sua mãe chorar escondida.
É brabo ficar tapeando
essa dor da cria ausente,
uma saudade inclemente
a cada dia aumentando.
Há, nos seus trastes, pairando
recuerdos que calam fundo.
Então, assim, num segundo,
num versejar de profeta,
lembro o que disse um poeta:
-
Os seus filhos são do mundo!
-
Os seus filhos são das ânsias,
vem
"por" vós mas não "pra" vós.
Não
são seus, nem dos avós,
são
das ruas, das distâncias.
Amparai
a sua infância
sem
ocultar os perigos,
sejais
parceiro, amigo,
não
poupai o vosso amor
mas
não lhes tire o esplendor
de
andejar longe do abrigo.
Pode ser... Pode até ser
mas até meu chimarrão
ando largando de mão
por matear sem ter prazer.
O rancho, no entardecer,
é um manancial de tristeza,
não tem cor a natureza,
ficou mudo o violão
e se agranda a solidão
c'um prato a menos na mesa.
E pensar que fiz igual
quando deixei os meus pais
nem reparei nos seus ais
e hoje sofro o mesmo mal.
Assim é a vida, afinal,
tudo que nasce tem fim.
Mas... queria ter dito assim
pro meu eterno menino:
- Que vá trançar teu destino
mas volte, um dia, pra mim!