RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA
LEVANTA GAÚCHO ! Foto: Reprodução G1/Globo

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

BATEU SAUDADES

 
 
Do Olímpico até a Arena do Grêmio, meu parceiro velho e eu.
 
Hoje longe, neste dia, bateu saudades.
 
Parabéns pelo teu aniversário, meu filho. 

 
 
 

BATEU SAUDADES

 

Meu filho deixou "as casas",

achou por bem ir embora

e no singrar da aurora

com esforço bateu asas.

Na malinha velha e rasa

juntou sua roupa singela.

Atravessou a cancela,

olhou, por fim, para trás

e lá se foi meu rapaz...

Eu vi tudo da janela. 

 

Deixou aqui suas lembranças,

seu cavalo, seu cachorro

e já no segundo morro

se sumiu o meu confiança,

o meu guri, minha herança

de sangue, honra e sequência

mas levou junto a essência

do que podemos lhe dar

o amor fraterno de um lar  

e o respeito querência. 

 

Na verdade havia um tempo

que ele pensava nisto,

camperear algum serviço

que lhe provesse o sustento

pois ninguém vive do vento

soprando nos tarumãs.

Com cheiro de picumã

encroado na camisa

se foi, cruzando divisas,

sem saber do amanhã.  

 

Essas terras não são mais

como eram antigamente,

campos vastos, com vertentes

recortando os pastiçais.

O labor dos ancestrais,

(assim contam e assim é),  

uns herdeiros de má-fé

transformaram tudo em nada,

hoje resta uma invernada  

que a gente cruza de a pé. 

 

Mas vão ficar os floreios,

as gauchadas terrunhas

derrubando touro a unha

num pelado de rodeio.

Nunca teve tempo feio

quando junto de meu filho.

Agarrador num lombilho,  

dava gosto, na lavoura,   

ver descer foice em vassoura

para abrir um espinilho.

 

Ele foi, nós continuamos 

qual pinheiros centenários  

a cumprir este fadário   

de aguentar os minuanos.

Gente humilde, interioranos

labutando nesta vida

de uma maneira sofrida

pois os sonhos, os desejos

esvoaçam quando vejo  

sua mãe chorar escondida.

 

É brabo ficar tapeando

essa dor da cria ausente,

uma saudade inclemente

a cada dia aumentando.

Há, nos seus trastes, pairando

recuerdos que calam fundo.

Então, assim, num segundo,

num versejar de profeta,

lembro o que disse um poeta:  

- Os seus filhos são do mundo! 

 

- Os seus filhos são das ânsias,

vem "por" vós mas não "pra" vós.

Não são seus, nem dos avós,

são das ruas, das distâncias.

Amparai a sua infância

sem ocultar os perigos,

sejais parceiro, amigo,

não poupai o vosso amor

mas não lhes tire o esplendor

de andejar longe do abrigo. 

 

Pode ser... Pode até ser

mas até meu chimarrão

ando largando de mão

por matear sem ter prazer.

O rancho, no entardecer,

é um manancial de tristeza,

não tem cor a natureza,

ficou mudo o violão

e se agranda a solidão

c'um prato a menos na mesa. 

 

E pensar que fiz igual

quando deixei os meus pais

nem reparei nos seus ais

e hoje sofro o mesmo mal.

Assim é a vida, afinal,

tudo que nasce tem fim.

Mas... queria ter dito assim

pro meu eterno menino:

- Que vá trançar teu destino

mas volte, um dia, pra mim!