RETRATO DA SEMANA

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Identidade Visual dos Festejos Farroupilha 2024 / Cintia Matte Ruschel

sábado, 17 de outubro de 2015

A ZONA FRANCA (CAUSO DE GALPÃO)


Causo recolhido por Apparício da Silva Rillo (que nesta foto aparece com o violão)
 sendo editado no seu livro Rapa de Tacho 3, Ed. Tchê.

Tanto quanto sei, este causo é de curso corrente no Rio Grande do Sul. Nas vezes em que o escutei, mudaram apenas os personagens e o local. Mas vou relatá-lo como o conheci pela primeira vez, exatamente num comício do Partido Libertador – o meu velho PL de saudosa memória – que se realizava na localidade de São José, na época distrito de São Borja. Isso lá por 55 ou 56.

Solano Francisco Borges, hoje ministro do Tribunal de Contas do Estado, e seu companheiro de partido, o bacharel Hed Borges (Borges, os dois, sem que fossem parentes), percorriam a região das Missões em campanha eleitoral. Solano, que tinha o forte de sua votação nos municípios de Jaguari, São Pedro, Santiago e São Borja, dava uma quarteada a seu companheiro de sigla partidária, candidato preferencial por Santo Ângelo e arredores.

Cumpriam, como todos os políticos dos velhos e novos tempos, um cansativo itinerário por redutos interioranos, visitando os caciques e chefetes, cabos eleitorais, indecisos e votantes de primeira carreira. Comiam o pó das estradas de terra colorada da região, o pão que o diabo amassou e, invariavelmente, um churrasquito nem sempre de boa carne na casa de um correligionário mais aquentado pelos pilas. Após a carne, um comício para meia centena de libertadores e os inevitáveis curiosos das reuniões deste tipo.

A visita ao chefe político local – fosse de que fundão de mundo – era imperiosa, sob o risco de perda de votos que seriam importantes na decisão do pleito já aprazado.

O causo, como já referi, embora com um único desfecho, tem como protagonistas, aqui e ali, tais ou quais políticos, tais ou quais chefetes de partido. Mas como o causo é meu (sou quem está contando), vai como o escutei há quase trinta anos.

Solano e Hed teriam chegado à casa de um correligionário influente na divisa de São Luiz Gonzaga e Bossoroca (onde a ovelha não tem lã e o tatu não sai da toca). Após os cumprimentos de praxe, o puxar dos bancos para a sombra, os copos de água fresca e os comentários sobre o tempo, o estado dos bois e das safras, Solano – com o modo calmo de falar que é uma de suas características – dirigiu-se ao cacique eleitoral:

- E então, prezado chefe, como vai a zona?

O hoje ministro, como entendem todos, pretendia inteirar-se da situação eleitoral da região. Mas sucede que “zona” tem outra acepção que não a clássica, pelo menos no Rio Grande: pode significar o local onde se situa o baixo meretrício, os cabarés, onde as “meninas” que se pintam, bebem e dormem tarde, dedicam-se à mais antiga profissão do mundo.

Ao ser indagado como ia a “zona” o chefe libertador, chegado a molhar a goela em água que passarinho não bebe, entendeu o termo na sua acepção boêmia. Sorriu com um arzinho cúmplice de malandro de campanha e lascou, a meia voz:

Pois olha, doutor Solano e doutor Hed, até que dá pra meter o cavalo. Nesta semana chegaram duas ou três coxudas que não são de botar fora.

Ante a surpresa dos dois políticos, face ao inusitado da resposta, ainda arrematou:

- E tem mais: são potrancas pra qualquer serviço que uns colhudos como nós possam querer...