ATAVISMO
- Léo Ribeiro de Souza -
Trago
ao reponte um destino, um fado,
e
que me prende a cultivar raízes
correntes
de aço, grilhões bem cadeados
silenciosos,
densos, invisíveis.
É
algo estranho, não nasci no campo,
não
tive estância ou pingos de lei,
mas
aqui dentro tenho acalantos
pela
querência onde me criei.
Sei
que tem nome esse ardor latente:
É
atavismo, reaparições,
e
que renasce nalgum descendente
mesmo
passadas muitas gerações.
Por
certo alguém de antigas eras
doou-me a sina de apego ao chão,
talvez
um negro que virou tapera
quando
em Porongos lhe gritaram - Não!
Quem
sabe um índio que fugiu da tribo
ou
um soldado lá de Gumercindo,
crente
no braço, muito bom no estribo,
destes
gaudérios que peleavam rindo?
Mas
também pode ser um pajador,
ou
um poeta com a pena em riste,
vates
que sabem versejar o amor
para que o mundo fique menos triste.
Talvez
eu venha do distante Açores
singrando
mares pra povoar aldeias,
um
litorâneo suportando as dores
pra
ser pendão deste chão de areia.
Sou
meio assim... colcha de retalhos,
colono
guapo trabalhando a terra,
um
missioneiro ao pé do borralho,
um
rio-grandense da fronteira à serra.
Carrego
a imagem de tantas Anitas,
de
Cabos Tocos, guerreiras de brilho,
e
a ternura daquela mãe solita
nas
madrugadas acalentando um filho.
Sou
prisioneiro de airosas lendas,
folhas
de livros, baús da memória,
de
tempos feios ou gloriosas sendas
donde
criou-se minha própria história.
Eu
fui flechado, mas não sei o dia,
pelo
atavismo de algum Querubim
e
desde então, pela poesia,
avulto
a chama que habita em mim.
Sou
qual o Boca, lembrei de vereda
deste
terrunho que dizia em verso:
-
Eu sou gaúcho e isto me chega
pra
ser feliz em todo o universo.
*Boca: Poeta e
declamador Marco Aurélio Campos