RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA
A tomada da Ponte da Azenha, do pintor Augusto Luiz de Freitas (Instituto de Educação General Flores da Cunha, Porto Alegre/RS)

sábado, 12 de dezembro de 2020

NOVE ANOS SEM JOSÉ CLAUDIO MACHADO

 


 Velório de José Claudio Machado / Câmara de vereadores de Guaiba
Diante do caixão o grande Telmo de Lima Freitas
Foto: Léo Ribeiro

José Cláudio Machado nasceu em Tapes, RS, em 17 de novembro de 1948. Começou sua carreira de cantor no antigo conjunto Os Tapes e consagrou-se para o grande público ao vencer a Califórnia da Canção Nativa de 1972 com a composição Pedro Guará, um clássico regionalista.

Participou como intérprete, em duas ocasiões, do conjunto Os Serranos. Na minha opinião, o melhor álbum do grupo foi "Isto é... Os Serranos", no final da década de 1980, muito se devendo a participação do José Cláudio.

Intérprete de canções consagradas como Pêlos, De Como Cantar um Flete, Milonga Abaixo do Mau Tempo, Cantar Galponeiro e outras tantas, Zé Cláudio foi do tango cantado em espanhol a nossa música de raiz com a mesma desenvoltura.

José Claúdio Machado teve estilo próprio mas, se fosse compará-lo, o classificaria como um Noel Guarany contemporâneo. Ambos traziam as ânsias gavionas de não acomodar-se ante o que consideravam errôneo. Criticavam mesmo, em verso e prosa. Várias são as histórias do crioulo de Tapes que hoje, apenas nove anos após sua morte, são contadas e recontadas.

Foi um dos idealizadores do Parque da Harmonia, hoje identificado como reduto dos tradicionalistas sobretudo no período que antecede o 20 de setembro.

– Aquilo ali era primeiro um aterro, nós íamos fazer churrasco, passar o dia, jogar bocha. Um dia saiu um acampamento. E, quando se viu, era um parque – declarou, em uma de suas últimas entrevistas.

José Claudio Machado morreu no dia 12 de dezembro de 2011 aos 63 anos após ficar internado por seis meses para tratar de um enfisema pulmonar.  

O "Zé" Cláudio é considerado por muitos como o melhor cantor da musicalidade crioula rio-grandense de todos os tempos porque aliou à estampa gaudéria, à irreverência dos bugres bolicheiros, com uma voz de trovão, afinada e retumbante, que acordava e continuará acordando as madrugadas campeiras desta terra.


ASSIM NOS MANIFESTAMOS NO DIA 13 DE DEZEMBRO DE 2011


O céu segurou seu pranto... Quando saí de Porto Alegre, em riba das sete e quinze, neste dia 13 de dezembro de 2011, rumando a Guaíba, histórica cidade do revolucionário Gomes Jardim, o tempo estava osco, cinzento, com nunvens que mais pareciam pelegos de chumbo estaqueados no firmamento. Uma "Milonga Abaixo de Mau Tempo"!

Fui dar meu - até um dia, a José Cláudio Machado, o Cantor Galponeiro, um dos últimos galos-dourados da musicalidade terrunha rio-grandense.

Quando estacionei o carro defronte a Câmara de Vereadores de Guaíba, local das encomendações, um bugre gaúcho de barba e melena brancas pitava um cigarro de palha com os olhos marejados. Pensei comigo: A coisa é por aqui mesmo.

Enquanto trancava minha condução, um fiat Sena com placas de Tapes volteava o prédio com o rádio a toda a goela, com canções do "Zé" Cláudio. Uma homenagem solitária de um fã já saudoso.

Lá em cima, após três lances de escadas, o salão do legislativo guaibense mais parecia um galpão de terra batida, em face da peonada que proseava em voz telúrica e respeitosa. No centro, o ataúde com o maior cantor campeiro do Rio Grande. Sorriso debochado, boina na testa, bombacha e jaleco cinzas, camisa azul, lenço grená e o inseparável chapéu preto preso entre os dedos.

Fiz minhas orações agradecendo a Deus, e ao Zé, por todo o atavismo, xucrismo, gauchismo, e outros "ismos" mais que ele nos regalou. Posso dizer que sou feliz por ter sido contemporâneo deste taura que jamais se dobrou e que fazia em vida o que cantava nos versos.

Ao sul do caixão o pala preto, a bandeira do Rio Grande, de Tapes e de Guaíba. Ao sul do sul, uma legenda orava em silêncio por um de seus pares que abria o pingo e se ia... Telmo de Lima Freitas. Aliás, muitos eram os artistas que admiravam e seguiam os passos deste monarca pampeano mas poucos foram levar seu apreço ao cantador. 

Na verdade, o que importava ao Zé Cláudio era a gente simples e humilde, a peonada, e esta, marcou terreno com suas preces.

Perto das onze o padre (ou pastor) todo pilchado fez as derradeiras e bonitas orações. Após diversos pronunciamentos, reverências, saudades expressas com sentimento, num cortejo, longo e triste, aos 63 anos de idade o Patrão de todas as querências levava para junto de si o mestre dos mestres da cantoria: José Cláudio Machado!

E o céu... Segurou seu pranto!

Léo Ribeiro