RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA
Recuerdos da companheirada e do velho parceiro (Mouro Negro).

segunda-feira, 23 de julho de 2018

REPONTANDO DATAS / 23 DE JULHO



Num dia 23 de julho, do ano de 1901, morria em Montevidéu Gaspar da Silveira Martins, pai dos maragatos de 1893. Advogado, fazendeiro, político, conselheiro do Imperador D. Pedro II e excelente orador.


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Fragmentos do texto de Walter Spalding sobre Gaspar S. Martins,

Gaspar Silveira Martins nasceu em Cerro Largo, República Oriental do Uruguai, a 5 de agosto de 1834, na estância avoenga, sendo batizado a 5 de março de 1835.

O Correio do Povo de 25 de julho de 1901 estampava, em destaque a seguinte notícia: -"Tivemos ontem, pelo telégrafo, a triste notícia do falecimento, em Montevidéu, do Dr. Gaspar Silveira Martins. O patrício ilustre, cuja morte o Rio Grande deplora, tem o seu nome vinculado de modo imperecível à história do nosso Estado, que ele muito amou e por cujo progresso moral e material, muito se esforçou. O Rio Grande do Sul chora a morte de Silveira Martins que, com justa razão, figurará na galeria dos nossos varões ilustres como um grande patriota. A notícia da sua morte, espalhou-se ontem rapidamente pela Capital e, desde logo, os escritórios dos jornais foram procurados por grande número de pessoas que, pesarosas, pediam informações a respeito. O Dr. Gaspar Silveira Martins devia completar no dia 5 de agosto próximo, 66 anos de idade".

Silveira Martins estava, ainda, no exílio em Montevidéu, apesar da paz de 1895, assinada em Pelotas, pondo fim à Revolução Federalista de que fora o chefe civil. Sua morte, ocorrida a 23 de Julho, treze dias antes de completar 66 anos de idade, em verdade muito abalou o mundo político brasileiro, principalmente o ligado ao federalismo, e sobremodo escandalizou a sociedade em virtude da situação em que se dera o falecimento do grande tribuno.

Só, longe do lar, vivendo em hotel na capital uruguaia, homem fogoso, bastante dado a mulheres, jamais se negou aos prazeres da carne de que ele usava e abusava e foi por isso que sua morte, ao lado de uma dessas vivandeiras, à meia tarde, escandalizou, lamentando-se, porém, tenha sido esse o fim do tribuno que fazia temer o adversário desde a sua juventude, quando subiu pela primeira vez à tribuna parlamentar, ou quando, em 1869, proferiu aquela sua conferência clássica sobre o Radicalismo, abalando consciências e arrastando multidões.

Era, na realidade, um fim muito triste, esse do ex-Ministro da Fazenda do Gabinete de 5 de janeiro de 1878, desse Ministro que havia proposto o voto aos católicos, exigindo reforma da Constituição, e que por não ser atendido, rompeu, não apenas com o Presidente do Conselho Cansansão de Sinimbu, mas com seu próprio companheiro Ministro da Guerra, senador Marquês do Erval.

Entretanto, esse final melancólico da grande vida em nada afetaria as suas ideias, as suas atividades de patriota e progressista que jamais recuou. Foi um homem de pensamento, como poucos tem tido o Brasil nestes seus quase quinhentos anos de História, no terreno político principalmente. E nem mesmo atingiu a integridade do homem que foi, durante sua vida, exemplo de dignidade, de dedicação, de honradez de homem público, líder inconteste do liberalismo brasileiro a partir do dia em que se apresentou na vida política da Nação. Iniciando-se na política, logo após sua formatura na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1855, contando, pois, 21 anos de idade Gaspar Silveira Martins foi subindo, à custa de sua inteligência, de seu talento, de sua cultura. Degrau por degrau, chegou a Ministro, em 1878, com apenas 44 anos.

Era Silveira Martins o tribuno máximo do Brasil Império, que entraria pela República, coerente com seus princípios, combatendo oligarquias e ditaduras, exigindo liberdades e direitos que se vinham conculcando, no Rio Grande do Sul, através de leis, de conchaves e de ordens subterrâneas, num desrespeito integral à dignidade humana do adversário. Nasceu dai a Revolução, revolução que ele, Gaspar Martins, não queria, mas teve que aceitar porque o povo, aquele mesmo povo que ele conduziu e educou nos princípios da liberdade e do radicalismo que sempre pregou, o quis e o obrigou a presidir, como chefe civil.

Mas não foi possível evitar a luta. As provocações foram excessivas e Joca Tavares com Gumercindo Saraiva, invadiram o Rio Grande do Sul pensando calarem de imediato as diatribes e arbitrariedades que campeavam pelo Estado, ordenadas, provocadas, consentidas pelo governo de Castilhos. Paulo José Pires Brandão, neto materno e afilhado do Conselheiro Antonio Ferreira Viana, conheceu Silveira Martins em casa do avô. Em seu livro Vultos do Meu Caminho, assim descreve o imortal conselheiro: "Alto, corpulento, grandes óculos, barba toda aberta e branca, pele muito vermelha. Voz de trovão, gesto largo, não sabia falar baixo, e mesmo quando palestrava era em tom de discurso, e a sua voz clara, sonora e forte invadia a sala onde estava, os corredores, o hall, a casa inteira, atravessando a rua. Não falava ao ouvido de ninguém, não dizia segredos, nem os tinha, mesmo porque a sua voz não dava diapasão para sussurros, não murmurava: tonitroava".

Com a Proclamação da República, estando Gaspar Martins na Presidência do Rio Grande do Sul, foi preso e deportado.

Pouco antes do 15 de novembro de 1889, fora Gaspar chamado à Corte para formar novo Ministério, com intenções de evitar a queda fatal. Foi tarde, porém. Ao chegar no porto de Desterro (depois Florianópolis), já a República havia sido proclamada e Gaspar Martins aprisionado. Seguiu para a Europa.

Lá o encontrou Pires Brandão, que viajava com o avô, também deportado. E conta que, ao atravessar o Canal da Mancha, encontra a bordo o diplomata e jornalista francês Tachard, a quem foi apresentado. Diz Pires Brandão: "Falou Silveira Martins toda a travessia. Ao desembarcar na Inglaterra, disse Tachard a meu avô: Não há no mundo governo e instituições que possam resistir a um homem como este, que atravessa a Mancha discutindo Renan! Um país que deporta um homem desses, ou é um país de sábios ou de ignorantes".