RETRATO DA SEMANA

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Identidade Visual dos Festejos Farroupilha 2024 / Cintia Matte Ruschel

quarta-feira, 13 de abril de 2016

COMO A CRISE AFETA A TRADIÇÃO


 
 
A crise econômica que assola o Brasil gerando insegurança em diversos setores da sociedade atinge, também, a tradição gaúcha. Na verdade este processo acentuou-se com a doença do Mormo que no ano de 2015 acampou pelo Rio Grande do Sul, inclusive originando o sacrifício de alguns animais e decretando a obrigatoriedade da respectiva vacina (que tem prazo de validade curto), para que a Guia de Transporte Animal fosse liberada, ou seja, para obter e GTA e conduzir os animais para rodeios, cavalgadas e atividades afins, era - e ainda é - necessário este requisito que, além de tornar tudo mais burocrático, custa em torno de 200 reais.
Por conta disto, diversas cidades do Estado cancelaram os Desfiles Farroupilhas Tradicionais no ano passado e as que realizaram, como foi o caso de Porto Alegre, o fizeram por honra e glória pois a participação de cavalarianos foi muito pequena em relação a anos anteriores.
As cavalgadas seguem no mesmo tranco e o ícone destes eventos, a Cavalgada do Mar, que outrora já contou com mais de 3 mil cavalarianos, em fevereiro de 2016 cruzou as areias de Torres a Palmares com não mais de 500 participantes. O custo para manter um cavalo numa hospedaria gira em torno de 400 reais ao mês, patacas que podem fazer falta para o pagamento do condomínio, da luz, do telefone...
Nossos rodeios viraram puro comércio e frequentá-los não é nada fácil. Além de custear o já citado transporte dos animais, se paga para acampar, para laçar, alimentação e o trago... Vejam os valores exorbitantes da erva-mate.
E os bailes? A maioria dos Centros de Tradições passam por naturais dificuldades e arrecadar de 15 a 20 mil para um conjunto de renome é uma tarefa ingrata para a patronagem. Sem contar que baile é lazer e o lazer vem depois da saúde, da alimentação e do próprio trabalho que anda cada vez mais minguado. Sendo assim, os frequentadores vem escasseando e as bailantas acontecem em número bem menor. Os grupos musicais, para não ficarem parados acabam baixando seus valores e, mesmo assim, em muitas ocasiões, encontram empecilhos para o recebimento como cheques sem fundos e outras coisitas mais.
Tudo isto é um efeito dominó pois o sócio não comparecendo com sua mensalidade, o CTG vai mal e não paga as coordenadorias regionais, estas, por sua vez, não repassam valores integrais ao Movimento Tradicionalista Gaúcho que, assim, encontra dificuldades para as realizações de seus eventos.
Os próprios festivais, encontros musicais agregadores e difusores do nativismo, que aconteciam aos borbotões na década de noventa, hoje só ocorrem, em número bem menor, por força de pessoas abnegadas das comunidades promotoras. Para piorar, ao que parece, no âmbito Estadual, a corrupção também anda rondando alguns setores da Lei de Incentivo a Cultura. A nível federal a Lei Rouanet prefere voltar seus olhos para os grandes nomes da música nacional como é o caso de Chico Buarque, Giberto Gil, Caetano Veloso, Maria Bethania e outros do mesmo naipe. Os pequenos artistas dificilmente veem seus projetos aprovados.
Neste quesito também somos culpados pois nossas festas regionais preferem desembolsar 100 mil para qualquer duplinha sertaneja que apareça por aqui em detrimento de nossos cantores terrunhos que brigam a tapa para receber 10 mil por um belo e autêntico espetáculo.  
A bem da verdade o cultivo das tradições gaúchas nunca foi muito barato, monetariamente falando, pois montar uma pilcha completa não sai por menos de 700 reias. Um vestido de prenda também não fica muito aquém destes preços. Uma encilha para seu cavalo ultrapassa estes valores. Porquanto agora, com a crise e o desemprego batendo às nossas portas, temos que optar onde, como e quando vamos "gauderiar".
Em suma a tradição gaúcha depende, como nunca, do voluntariado que, desprovido de recursos, encolhe-se como mondongo na brasa.
A esperança é que tudo se defina, a economia volte a crescer, os políticos tomem tenência de suas responsabilidades e nossa cultura retome sua pujança porque é complicado bombear entidades preservadoras dos nossos costumes como o Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, a Secretaria da Cultura e tantas outras peleando só com o cabo da faca, de mãos atadas e, como dizia o "Maluco Beleza", com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar.