General Joca Tavares, fotografado durante a Guerra do Paraguai
Num dia 19 de janeiro, de 1906, morria o General Joca Tavares, personagem por demais conhecido pois foi um dos comandantes maragatos na Revolução Federalista, em 1893, uma das mais sangrentas de nossa terra gaúcha, em face de que não se faziam prisioneiros, se degolava o inimigo. Foi Joca Tavares o comandante das tropas Federalistas (Maragatas) no famoso e épico Cerco de Bagé.
Mas o leitor sabe o que foi o CERCO DE BAGÉ? Se não sabe, acompanhe por aqui:
Durante a Revolução Federalista,
desencadeada no Rio Grande do Sul em oposição ao governo de Floriano Peixoto, a
cidade de Bagé resistiu ao cerco das forças federalistas durante 47 dias, em um
dos mais notáveis episódios da História Militar brasileira.
Entre novembro de 1893 e janeiro
de 1894, os republicanos, comandados pelo coronel Carlos Maria Silva Telles,
buscaram abrigo na Catedral São Sebastião.
Os antigos moradores de Bagé presenciaram de camarote um dos muitos
episódios sangrentos que tornaram a Revolução Federalista. uma das mais
violentas da história do Rio Grande do Sul e do Brasil.
Bagé era um objetivo importante,
pois uma das maiores cidades do Estado, sediava uma importante guarnição
militar, tinha ligação por trem com Rio Grande e situava-se em posição
estratégica em relação à Campanha e à fronteira. Além disso, era a terra dos Tavares e de
Silveira Martins, principais lideranças maragatas, que faziam de Bagé um dos
centros da conspiração e sede do Partido Federalista, uma das frentes de
oposição à Júlio de Castilhos.
Natural, portanto, que, ao
primeiro refluxo dos rebeldes, os republicanos tratassem de assegurar o
controle da cidade. Natural, também, que fosse Bagé o primeiro alvo do general
Joca Tavares em seu retorno ao Brasil, depois de refazer suas forças em
território uruguaio. Ele retorna em
novembro de 1893, à frente de quase três mil combatentes e ataca em duas
frentes. De um lado, Zeca Tavares, seu irmão, toma a estação ferroviária de Rio
Negro, a 20 quilômetros da cidade, guarnecida por 500 soldados comandados pelo
general Isidoro Fernandes. A outra
frente cerca a cidade. Desde o dia 24 de novembro era possível avistar os
piquetes de lanceiros federalistas da cidade, defendida por pouco mais de mil
combatentes, sob as ordens do coronel Carlos Maria da Silva Telles. A
população, pouco mais de 20 mil moradores, foge da cidade levando o que é
possível.
O coronel Telles se prepara para
o pior: requisita a comida disponível no comércio, manda construir trincheiras
ao redor da praça e concentra ali a resistência. Nas bocas de rua, arma
barreiras com fardos de lã, terra, pedras e paus.
Durante quase um mês, os
federalistas mantêm o cerco à distância e depois apertam. Ocupam chácaras do
subúrbio e entram na cidade. Tomam o Teatro 28 de setembro, a Beneficência
Italiana, o Mercado Público, os quartéis, a Rua Barão do Rio Branco e a Enfermaria
Militar. Em poucos dias toda a cidade é dominada, menos a Praça da Matriz.
Telles dispunha de batalhão e um
regimento de Artilharia, uma companhia de engenheiros, um batalhão da Brigada
Militar e um corpo de transporte, comandado por Bento Gonçalves da Silva Filho
(filho do líder farroupilha).
Tinha também dois corpos
provisórios, gente da Guarda Aduaneira e, a partir do momento em que apertou o
cerco, um “batalhão republicano”, com voluntários civis. O coronel tem ordens
expressas de Floriano Peixoto para resistir até o fim.
Corre na cidade sitiada uma
notícia apavorante: as forças de Isidoro Fernandes haviam sido massacradas no
Rio Negro, com mais de trezentos prisioneiros degolados. Começa a faltar
comida, há deserções, as fugas se dão pela zona sul da praça, onde era mais
fácil chegar ao cemitério que ficava a 600 metros. Joca Tavares ordena que o
cerco se feche num “cinturão de ferro e fogo”. Quando o sítio completa um mês,
Joca Tavares manda propor ao coronel Telles que se entregue sob garantias. O
coronel responde: “Vocês é quem devem depor as armas, porque estão fora da lei.
Garanto a todos a anistia ampla!”.
O natal foi terrível. Atordoada,
Bagé enterrava mortos civis atingidos por balas perdidas, chorava as vítimas de
violências, saques, incêndios e arrombamentos. Já não havia sequer figos crus e
caruru para cozinhar na água e sal. A farinha e as últimas bolachas estavam
reservadas para os feridos amontoados na nave central da igreja.
Para aliviar a fome, já se
matavam gatos e cães, e o próprio comandante da resistência manda matar seu
cavalo para alimentar a tropa. Fome, sede e doenças substituíram a famosa
degola na tarefa de abater o inimigo. Quando a situação parecia insuportável, chegam
informações de que duas divisões do Exército se aproximam para socorrer Bagé.
Com a aproximação dos reforços solicitados pelas tropas legalistas, em cinco de
janeiro de 1894, Joca Tavares resolveu promover o ataque final. Derrubando
muros e perfurando paredes, os maragatos avançaram. Informado da ação, o
coronel Carlos Telles antecipou a defesa, colocando abaixo paredes de dois
prédios que ainda não haviam sido alcançados pelos rebeldes. O tiroteio foi
intenso até que os legalistas dispararam os canhões e uma descarga de granadas
contra a linha federalista.
Na noite de sete de janeiro,
começa a ser desfeito o cerco, e os federalistas seguem desolados para Santana
do Livramento. Antes de o dia raiar, um vulto se aproxima das trincheiras,
solitário, e diz aos cansados e famintos soldados: “Bom dia! os revolucionários
deixaram a cidade”. Eles haviam resistido 47 dias de cerco. Telles envia um
telegrama ao ministro da Guerra: “Tivemos o desprazer de vê-los em debandada e
mal montados, sem terem tentado o ataque decisivo pelo qual tanto
ansiávamos...”. No seu boletim, registrou 34 mortos (quatro oficiais) e 91
feridos.