Andam falando pelo vizindário que amanhã, dia 21 de dezembro de 2012, o mundo vai acabar. Segundo o prefeito de minha cidade, São Francisco de Paula, somente quem for para lá, na serra, a 900 m acima do nível do mar, vai se salvar.
Antes desta catástrofe planetária anunciada pelo calendário Maia e confirmada por Décio Antônio Colla (prefeito de São Chico), quero me despedir de meus amigos, muitos que nem conheço, mas que, através deste blog, me proporcionaram momentos de intensa alegria.
Vi muitas coisas nestes meus 56 anos. Satisfações, sofrimentos.. Tive muitos prazeres e alguns dissabores.
Para quem nasceu num rancho pobre, num fundo de mato fechado, aparado por mãos de parteira (Dona Agostinha), acho que fiz bastante coisas, embora, talvez, pudesse ter feito mais.
Ali pelos 15 anos conheci a tradição gaúcha, e por ela me apaixonei. Fato que preservo e exalto até hoje.
Por isto, quando o mundo acabar, amanhã, eu parto feliz. Tsunamis, aquecimento global, erupções de grandes vulcões, "cinturão de fótons" e ventos solares não soterrarão aquilo que aqui deixamos de bom. Pelo que fui e sou, tenho o mais profundo carinho e a eterna reverência aos meus pais, Doralice Ribeiro de Souza e Bernardino Souza.
Nestes últimos dias de vida fiz um balanço de minha existência, somente na seara tradicionalista e os fatos que mais me marcaram foram estes, ilustrados nas fotos.
Participei, primeiro como peão, e depois como posteiro, por 10 anos, da invernada artística do CTG Rodeio Serrano. Ali, naquele ambiente fraterno e serrano, conheci minha esposa e tive os amigos da mais pura cepa crioula. Por aqueles tempos talvez eu tenha tido a adolescência mais feliz e desejada que um rapaz simples e limitado poderia almejar.
Editei oito livros e um dos que mais me marcou foi Honeyde Bertussi, O Cancioneiro das Coxilhas, onde, em 301 versos na métrica de sextilhas, pude homenagear este grande gaiteiro serrano (foto: tarde de autógrafos na Associação Atlética Banco do Brasil). Para o mal dos pecados, nem eu tenho mais este trabalho...
Na seara da poesia, além dos versos que rimei, um dos grandes prazeres que tive foi ter sido o 17º Presidente da Estância da Poesia Crioula, a Academia Xucra do Rio GRande, onde pude conviver com os maiores vates gauchescos e quebrar dois paradígmas. Fui o primeiro a colocar a estampa pilchada na galeria de ex-presidentes e fiz de meu sucessor uma poetisa, Beatriz de Castro.
Na Arte Real, a maçonaria, fui um dos fundadores do Piquete Fraternidade Gaúcha, o braço tradicionalista da Ordem. Ali, fui o terceiro patrão e coordenei ás três primeiras edições da Tertúlia Maçônica da Poesia Crioula, festival poético que hoje faz parte do calendário de eventos de Porto Alegre. Da Ordem Maçônica, recebi as medalhas Sepé Tiaraju e Bento Gonçalves, das Lojas Fiat Lux e Bento Gonçalves, respectivamente. Na foto, estou com o Grão Mestrado do Estado do Paraná.
Um de meus maiores prazeres são as cavalgadas. Fui fundador de dois grupos, os Cavaleiros da Neve, de São "Chico" e os Irmãos do Estribo, da maçonaria. De tanto andejar pelos varzedos deste pago recebi a comenda de Cavaleiro Rio-grandense. Não há nada que supere esta trilogia de natureza, gente, animal. Na foto acima, nossa chegada em São Jorge da Mulada, após três dias de andanças, para inauguração do memorial aos Bertussi.
Não toco, não canto, mas tenho alguma facilidade na escrita. Nesta seara, compus em torno de 300 letras que foram gravadas pelos mais diversos conjuntos regionalistas do Estado. Dentre estes, Os Monarcas do meu amigo Gildinho (foto). Meu estilo é o galponeiro, o campeiro, o serrano, mas me agrada por demais uma canção para ouvir mateando...
Participei de diversos festivais poéticos e musicais do Rio Grande, na grande maioria das vezes na condição de jurado. Foi assim no Carijo (2 vezes), Tafona, Sesmaira (foto), Ronco do Bugio (8 vezes), Guyanuba (3 vezes), Tertúlia Maçônica (2 vezes), Vacaria (3 vezes), Querência da Poesia, Laçador do Canto Gaúcho (POA) e tantos outros.
Nas artes plásticas editei um livro de cartuns gauchescos, ilustrei algumas capas de discos, pintei dezenas de quadros todos com temática regionalista, mas minha honra maior foi ter meu trabalho escolhido para ilustrar o sêlo comemorativo aos quarenta anos da 3ª Inspetoria de Contabilidade e Finanças do Exército, do Ministério da Defesa do Brasil.
Reconheço que, na defesa de minhas convicções, sou um cara chato e discuto até o último argumento. Uma destas certezas que trago é o apego á cultura sulina. Nas viagens que fiz, nos pagos alheios onde andejei, podia me faltar as ceroulas, mas a bandeira do Rio Grande sempre esteve ao alcance de minhas mãos. Sou um bairrista de cruz na testa e saio no tapa com quem falar mal de meu Estado!
Acredito que o esteio de tudo seja a família. Não sei como será o dia 21 mas se puder escolher, quero estar ao lado dos meus. Tenho o maior orgulho do seio onde nasci que, embora com poucas condições, me deu educação e estudo. Da mesma forma, muito me gusta as famílias Asmuz/Vallim, que me acolheram e com as quais convivo até hoje.
A todos os meus amigos, o meu fraterno abraço. Aos que ofendi com palavras ou gestos, peço perdão. Aos promotores das homenagens que recebi, inclusive em minha própria terra (foto) o que não é nada fácil, a minha gratidão. Repito que, talvez, pudesse ter feito mais por aquilo que tanto prezo que é a tradição de meu Estado. Contudo, penso que esta cruzada terrena não foi em vão. Até lá em riba, minha gente!