RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

E O MOURO VELHO PREGANDO PEÇAS...

Hoje quero falar de cavalo!

Não quero aqui ser redundante e recontar o valor que este animal teve na formação geográfica e histórica de nosso Rio Grande do Sul. Não vou aqui exaltar esta arma guerreira com alma latente.

A grande maioria das conquistas em batalhas, os poderosos exércitos, os inesquecíveis heróis, não encostavam os pés no chão. Tinham sob seu comando fletes ágeis e valentes. Do barbaresco Àtila, o Rei dos Hunos, ao qual se dizia que: onde seu cavalo pisasse, a grama não nasceria mais, até as cargas de cavalaria das tropas farroupilhas que, por serem ginetes hábeis no dorso do pingo, por dez longos anos sustentaram, com menos recursos e soldados, às tropas imperiais.

Também não quero ser repetitivo e falar aqui da importância que o cavalo teve (e tem) no trabalho das estâncias. Estâncias estas que eram o sustento das cidades.

Passado o tempo das revoluções, os cavalos foram armas de trabalho. Nas campereadas e tropeadas, tracionando carroças, desbravando varzedos e canhadas no transporte de pessoas... O cavalo foi á extensão das pernas do gaúcho na rude e dura lida pastoril e nenhum povo representa mais e melhor o centauro, figura mitológica, metade gente, metade animal, do que os bravos rio-grandenses.

Não vou aqui, também, falar de divertimento. De carreiras, tiros de laço, derrubar balcão de venda... Quantos poetas e canções descreveram tais momentos com mais sabedoria e preciosidade do que eu possa tentar fazer.

Quero falar aqui, de sentimento, de apego a um animal.

Segunda-feira, dia 09, me ligaram da hospedaria onde fica meu Mouro velho, meu confiança, companheiro de tantas jornadas por mais de 12 anos. Meu flete, disseram-me, estava com cólicas, se rolando no chão de tanta dor. Havia, de madrugada, fugido da cocheira e comido quase meio tonel de ração. Telefonei para o "veterinário" que o atende que me disse não poder ir vê-lo. O Lúcio, lá da cabanha, ligou para a doutora Rochele, esta sim uma dedicada a profissão que abraçou, que prontamente se fez presente. Ela (Dra. Rochele) me retornou contando que o quadro era grave e pedia autorização para levar o Mouro para o hospital veterinário do Jóquei Clube, no que autorizei prontamente e para onde também me dirigi. Cheguei antes deles, angustiado como há tempos eu não ficava. Ainda bem que minha esposa estava comigo.

Quando chegaram e vi o Mouro com o rosto todo esfolado de rolar no chão, pela dor que sentia, com a respiração ofegante e a barriga estufada, confesso, me segurei para não chorar. Reunidos com o doutor Fernando, que trata os cavalos do Jóquei, chegamos à conclusão que era necessário a intervenção cirúrgica. Valor: em torno de R$ 6.000,00. Não tenho este dinheiro sobrando e meu Mouro velho, monetariamente, não vale isto.

Aí é que entra o que realmente quero falar: O Sentimento!

Se tal cirurgia custasse R$ 20.000,00 R$ 30.000,00 eu autorizaria do mesmo jeito, nem que tivesse que vender um bem material para cobrir tal custo, pois meu apego, minha gratidão a esse bicho não tem preço.

Segundo o doutor Fernando, muitos, ao saberem dos custos, mandam matar os cavalos... Outros, mandam operar, mas não voltam mais para buscar o animal.

Me despedi do mouro (aí sim com os olhos marejados) dizendo:
- Parceiro! Vamos sair desta e andejar muito por estas querências do Rio Grande. Vou te esperar com um saco de cenouras daquelas que tu gostas tanto de comer!

A minha esposa, que nunca participou de uma cavalgada, arrematou com uma frase que me deu um nó na garganta:
- Doutor. Cuida bem dele, pois é como se ele fizesse parte da nossa família...

A cirurgia foi um sucesso e os cuidados agora são com uma laminite que dá muita dor nos cascos (o conhecido aguamento).

Todas as manhãs vou lá no Jóquei visitar meu cavalo e o Rafael, doutor que faz residência no hospital veterinário, me afirmou que a presença dos donos são importantes para a recuperação dos bichos. Coisa que eu acredito.

O Mouro (foto acima), aos pouquitos, se recupera de uma forte cirurgia que lhe salvou a vida graças a dedicação da doutora Rochele e dos doutores Fernando e Rafael. Creio que há muitos gaúchos que, como eu, sentem pelo sofrimento de seus companheiros de jornadas. Os que maltratam animais (não só cavalos) podem passar de liso por mim.

Mouro velho. Em seguidita estaremos recortando estas matas, campos e banhados de nossa querência como nos velhos tempos da foto abaixo. Mas, se por algum motivo não pudermos mais refazer estas proezas, vais continuar do meu lado, até que o patrão supremo nos permita.