No pequeno texto, escrito em versos, Simões usa a sátira como artifício para a crítica social. Atualmente fica difícil entender o sentido de crônicas como esta, porque elas fazem alusão a acontecimentos cotidianos, que tiveram repercussão momentânea. O assunto deve ter sido muito comentado nas rodas de conversa em Pelotas naquela época.
Segundo o pesquisador Luís Borges, um escravo chamado Tupaveraba havia morrido com suspeita de envenenamento, o que gerou uma polêmica entre vários médicos, que com o incentivo da imprensa eram convocados a dar sua opinião. No auge da controvérsia, um deles chegou a afirmar que concluíra que o escravo poderia ter sido envenenado ou não Simões Lopes, aproveitou-se da situação para tecer seu comentário. Segundo Borges, “Ele tinha uma postura positivista, era adorador da ciência e do progresso e por isso pode parecer contraditório que ele lançasse farpas tão sarcásticas à classe médica. Mas acontece que ele sofria de estrabismo, e quando jovem passou por uma cirurgia malsucedida que acabou por agravar seu problema de visão e esse fato marcou fortemente suas obras literárias. Sempre que podia, não perdia a oportunidade de ridicularizar os médicos, acusando-os de charlatães e inábeis”.
Além de acrescentar dados à biografia do escritor, o texto praticamente inédito representa uma inovação em termos de estilo literário, já que o poema, classificado por quem o transcreveu como um triolé, realmente parece, mas na verdade nãoé um legítimo triolé.
O triolé é uma forma fixa de poema com oito versos, muito utilizado na época. Simões Lopes Neto conseguiu modificar, com bastante ousadia, esse padrão literário e inovou onde não havia como inovar.
No poema, é possível reconhecer elementos de oralidade que posteriormente foram trabalhados pelo autor em seus “Contos Gauchescos”.
Triolé transcrito em grafia original
O pobre Tupaveraba
(Envenenado - sim ou não?)
Depois de morto retorna
Às luzes da discussão
O pobre Tupaveraba
(Envenenado - sim ou não?)
Vários Hipocrates gordos,
Varios galenos magros
Fulminam sem dó, nem pena:
É polvilho! Qu’envenena!?…
Varios Hipocrates gordos,
Varios galenos magros,
E rugem uns, riem outros,
Do - digo eu - diras tu?
- Tomou veneno o João!
- Não diga tal heresia!
- Senhores! Que gritaria!
- Apoiado! Tens razão!
E rugem uns, riem outros,
Do - digo eu - diras tu?
(Envenenado - sim ou não?)
Depois de morto retorna
Às luzes da discussão
O pobre Tupaveraba
(Envenenado - sim ou não?)
Vários Hipocrates gordos,
Varios galenos magros
Fulminam sem dó, nem pena:
É polvilho! Qu’envenena!?…
Varios Hipocrates gordos,
Varios galenos magros,
E rugem uns, riem outros,
Do - digo eu - diras tu?
- Tomou veneno o João!
- Não diga tal heresia!
- Senhores! Que gritaria!
- Apoiado! Tens razão!
E rugem uns, riem outros,
Do - digo eu - diras tu?
Mas, O outro coitado, dorme em paz.
Pelotas,
João Rimuito
Fonte : http://minerva.ufpel.edu.br/~bira/blog/?m=201009
Colaboração: Hilton Araldi