Uma família de
advogados de Santa Maria acaba de comprar um pedaço da história do Rio Grande
do Sul: o castelo de Pedras Altas, construção de arquitetura medievalesca
inaugurada em 1912. No local, foi assinado o acordo que pôs fim à luta entre
maragatos e chimangos, na Revolução de 1923.
O castelo de quatro
andares, 44 cômodos e patrimônio histórico tombado pelo governo do Estado,
ainda abriga mais de 7,2 mil livros, sendo oito obras publicadas de 1400 a
1500. Há raridades, como dois volumes da Enciclopédia, de Diderot e D’Alambert,
de 1751.
A construção fica em
Pedras Altas, município de apenas 1,9 mil habitantes na Região Sul, a 400
quilômetros de Porto Alegre. O acesso é pela cidade de Pinheiro Machado, sendo
17 km do trajeto em estrada de chão.
O imóvel pertenceu a
Joaquim Francisco de Assis Brasil, estancieiro, político, advogado e escritor
que dá nome a avenidas de diversas cidades gaúchas e ao parque de exposições
que abriga anualmente a Expointer, em Esteio, na Região Metropolitana. Assis
Brasil viveu no castelo até a morte, em 1938.
No local, foi assinado
o Pacto de Pedras Altas, que pôs fim à Revolução de 1923, que opunha chimangos
(liderados por Borges de Medeiros) e maragatos (aliados de Assis Brasil).
Os novos proprietários
do castelo e da propriedade de 300 hectares são três irmãos que vivem em Santa
Maria: os advogados Rafael Batista Segat, 35 anos, Gabriela Segat, 33, e
Kamilla Segat, 30. A família também é dona da Cabanha Segat, que cria cavalos
crioulos.
O patriarca da família
e presidente da recém-criada Associação do Castelo de Pedras Altas, o advogado
Luiz Carlos Segat, 55 anos, afirmou a GZH que os Segat pretendem abrir os dois
primeiros andares para visitação ainda neste ano. Os outros dois pisos ficarão
restritos à circulação privada do clã.
— O objetivo é abrir
para visitação pública. Se vai ser instituto cultural ou museu, depende do
Iphae (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do
Sul) e dos órgãos competentes. Estamos com projeto para restauração, porque o
objetivo é preservar. Ano que vem é o centenário da assinatura do Tratado de
Paz de Pedras Altas — diz o patriarca Segat.
A expectativa ainda é
reconstituir o cenário de quando o castelo estava sob posse de Assis Brasil,
com cavalos, aves (incluindo galinhas importadas dos Estados Unidos), gado e
ovelhas de raças da época.
São necessárias
reformas para combater infiltração, restaurar janelas e outras adaptações. Para
custear os trabalhos e a abertura ao público, a família Segat espera obter
financiamento via Lei Rouanet – há empresários interessados em contribuir com
doações, segundo Luiz Carlos.
Questionado por que a
família se interessou em adquirir uma propriedade de tamanho valor histórico, o
patriarca afirma que a ideia inicial era comprar terras para plantação de soja,
comum na região e também cultivada na propriedade do castelo. Mas, ao descobrir
o imóvel e o valor histórico, a família “se apaixonou” pela área.
— Nos encantamos com
toda a história que tem aqui dentro. Se a lavoura era, no início, o foco
principal, hoje, está em segundo plano. A conservação do castelo e a utilização
para visitação pública se tornou prioridade — acrescenta o advogado.
Luiz Carlos não revelou
o valor da propriedade, a pedido dos filhos. Em 2015, o castelo foi alvo de
negociações na casa dos R$ 8 milhões com uma ONG de Moçambique. O imóvel foi
comprado dos herdeiros de Assis Brasil, que administravam o castelo
conjuntamente. Entre 18 familiares, 16 já assinaram o documento de venda. A
bisneta de Assis Brasil, Suzana de Assis Brasil Mendes, conta que a chave do
castelo já foi entregue aos Segat.
— Eu gostaria que o
castelo ficasse com a família, mas houve dificuldade grande de obter apoio
público e privado para manter. Quando tu tens um imóvel tombado, é ilegal uma
pessoa privada receber dinheiro público. A família fez votação e preferiu
vender. Temos amor pelo castelo, e por ter amor é que decidimos vender, porque
não tínhamos capacidade nem condição financeira de abrir as portas — diz a
bisneta de Assis Brasil.
Na sexta-feira (4), o
castelo foi visitado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do
Estado do Rio Grande do Sul (Iphae) e pela secretária de Cultura do Rio Grande
do Sul, Beatriz Araujo.
Nos últimos anos, o
local, que é de propriedade privada, vinha sofrendo com o abandono, se tornando
alvo de arrombamentos, invasões e furtos. A deterioração da estrutura já foi
alvo de inquérito no Ministério Público. Para cumprir um termo de ajuste de
conduta, os Assis Brasil promoveram reformas no telhado do castelo. Com a
venda, a expectativa da própria família é de que o imóvel seja reformado e
possa ser usufruído pela população gaúcha.
Fonte: Jornal ZH