RETRATO DA SEMANA

RETRATO DA SEMANA

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

REPONTANDO DATAS / 20 DE FEVEREIRO


NASCE HONEYDE BERTUSSI
O CANCIONEIRO DAS COXILHAS
 


Pelo escritor são-borjense: Israel Lopes 

 

Hoje, dia 20 de fevereiro, Honeyde Bertussi, nascido em 1923, estaria completando 96 anos de idade. Há pouco, por ocasião do aniversário do grande artista, estive fazendo a minha humilde reverência ao esse PALADINO DA MÚSICA REGIONALISTA GAÚCHA. Naquela oportunidade, postei as capas dos livros: "HONEYDE BERTUSSI, O Cancioneiro das Coxilhas", de autoria de Léo Ribeiro de Souza (1994) e "HONEYDE BERTUSSI - Música, Festas e Bailes", organizado por Guadalupe Teresinha Bertussi e Neura Cecília Todeschini (Educs/Edigal, 2014). Livros importantíssimos para melhor conhecermos a trajetória desse grande músico, compositor, cantor, pesquisador, historiador e folclorista. Pois, agora, para reverenciar o aniversário natalício de HONEYDE BERTUSSI, reproduzo a capa do livro "IRMÃOS BERTUSSI - História de uma Grande Dupla de Acordeonistas", de autoria de Charles Tonet e Tânia Tonet (Editora Belas Letras, 2012). Além disso, quero destacar mais dois grandes trabalhos sobre Honeyde Bertussi e consequentemente sobre a História dos Bertussi: "Os Gaiteiros de Criúva", da historiadora Lisana Bertussi, publicado na REVISTA GAÚCHA, de Caxias do Sul, na década de 1970. Também, "OS IRMÃOS BERTUSSI E A MÚSICA DE BAILE NO RIO GRANDE DO SUL", do professor Fernando Ávila (tese de Bacharel em Música Popular, UFRGS, 2015). Todos esses trabalhos são importantíssimos para conhecer a obra musical desse grande artista que foi HONEYDE BERTUSSI e OS BERTUSI, é claro. Então, como homenagem a HONEYDE BERTUSSI e ao seu irmão ADELAR BERTUSSI e a todos os BERTUSSI, eu reproduzo o que disse o grande folclorista João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes na contracapa desse livro, dos jornalistas Charles Tonet e Tânia Tonet, de Caxias do Sul:

"Os Bertussi, no início da década de 1950, começaram a surgir com gravações de 10 polegadas, produzindo os discos Coração Gaúcho I e II. E a partir daí começou, no cenário fonográfico e sonoro brasileiro, uma coisa inédita: a música com dois acordeonistas e cantando em duas vozes. Isso não existia no cenário brasileiro. Eles abriram um importante momento histórico nacional e, consequentemente, rio-grandense, até então restrito a Pedro Raymundo.

"Em razão de duas gaitas, um desenvolvia a mão direita, que era a melodia, e o outro, a esquerda, que era o acompanhamento. Então, eles surgiram da junção da sensibilidade musical e das heranças musicais transmitidas pelo pai, o velho Bertussi, que eu conheci e alegrou muito, antes dos filhos começarem a tocar os dois acordeões".



A prenda Alessandra Motta tendo seu trabalho avaliado por Honeyde Bertussi
que apesar de sua fama sempre colaborou nos diversos concursos


Dentre os centenas de milhares, que conheceram, viram ou ouviram os Irmãos Bertussi, e em especial o Honeyde, com certeza, eu serei apenas mais um a contar detalhes da vida dele entre seus fãs.

Um homem refinado, culto, educado, simpático, simples, cônscio de sua importância, mas sempre trajado à gaúcho, modestamente, sem ostentação, para ser e era igual a todos os gaúchos do nosso Rio Grande do Sul.

Eu era guri, 1957, Centenário de Passo Fundo, a musicalidade gaúcha ainda engatinhava, mas contrataram os Irmãos Bertussi para abrilhantar os festejos, e os esconderam nos fundos dum Pavilhão da Prefeitura Municipal, ergueram um tablado simples e ligaram uma lâmpada de 60 wats acima de suas cabeças, para que a plateia,  reduzida, a não mais de uma centena de pessoas, pudessem vê-los tocar suas gaitas Todeschini.

Eu fiquei estupefato, eu já ouvira no Rádio, tocadores de 8 a 80 baixos, como Pedro Raymundo, Osvaldinho e Zé Bernardes, ou Percival Garcez e Zéquinha Gregório, e os músicos do recém criado CTG. Lalau Miranda, mas quando os vi, dois gaúchos, de pé, naquele lusco fusco, tocando nas suas gaitas, a Marcha Triunfal Aida, era inimaginável estar ouvindo aqueles sons orquestrais e vendo a maestria da execução.

Cinco anos depois, adentram nas Lojas Floriani, dois gaúchos, bombachas largas e chapéus de aba grande,  eu de balconista, os recepciono sem saber quem são, e distendo os cortes de tergal e casimira inglesa no balcão, e levam dois cortes de três metros cada, para bombachas de dois panos.

Meu colega Valdir Cunha, depois que os clientes saíram me disse:

Estás famoso hoje!...e eu...porque?...Vendeu dois cortes de casimira para os Irmãos Bertussi.!

Estava eu a passeio em Santo Ângelo e fui na Fenamilho pois ali realizava-se mais um Congresso Tradicionalista, e casualmente me encontro no hall com meu inesquecível ídolo, Honeyde Bertussi, e depois das apresentações passei a lhe contar o que vos contei antes:

Seus olhos marejaram ao ouvir a primeira passagem, enxugou as lágrimas na segunda, e perguntado passou  ame  confidenciar, que estava guardando todos os seus discos, selados, como vieram da gravadora, pois assim exigiam naquela época, segundo ele, que estivessem intactos para virarem CD.

Nos reencontramos em 1985, quando da realização do 1º Rodeio Nacional de Integração Gaúcha de Passo Fundo, quando convidei a nata de juízes para julgamento das apresentações artísticas...muitos nem responderam, mas Honeyde Bertussi ligou-me de sua residência em Caxias do Sul, com aquela sua voz sonora, fazendo questão de vir a Passo Fundo...e quando perguntei pelos honorários, quase cai do cavalo, pediu apenas mil cruzeiros, a mesma pedida dum narrador prata da casa..vejam só a sua modéstia, e de quebra, se eu poderia arrumar um baile para o seu conjunto tocar.

Nos breves momentos em que privamos no Rodeio, atrás de sua fama e de seu sucesso, vi no seu caminhar e senti no seu semblante, um homem pensativo, quase triste, escondido atrás dos óculos, remoendo alguma coisa mal resolvida, deixando escapar numa dessas,  problemas familiares, que depois vim a saber, foram um atraso para a sua vida pessoal e artística.

Prova disso, são alguns títulos de suas letras e músicas, dentre as inúmeras cito apenas: Barco da Esperança, Saudade e Tristeza, Me Despedir Cantando, Ingratidão Não Tem Preço, Deusa de Barro, Eu Já Fui Feliz, Não me Calo, Rodeio da Vida, e ANA.

Enfim, o seu legado é de tal importância, tanto quanto de seu irmão Adelar que ainda vive, que não conseguimos ainda dimensionar adequadamente, falta uma biografia, um livro, uma grande história de vida, e principalmente de análise no tempo e no espaço, das letras, da  música da musicalidade, de estilo, de genialidade, sui generis, provinda de uma família musical, talvez de uma ancestralidade tirolesa, com uma cruza portuguesa dos Dutra e Siqueira.

Dos anos 50 até o dia de hoje, todos os gaiteiros, sem necessidade de citar um sequer, do menor ao maior do Rio Grande, foram influenciados pelo toque mágico de sua gaita e da sua inimitável tonalidade de voz, isso sem contar, as letras autênticas, eivadas de tradição e de patriotismo gaúcho.

Foi tal a sua influência nas famílias gaúchas, que havidas de homenagear com seu nome à seus filhos, não fizeram distinção, nominando homens e mulheres com o nome de Honeyde, como  a minha irmã,  e a sogra do meu filho, para exemplificar.

Como é linda a minha terra...e a minha garganta se embarga, os olhos lacrimejam ao lembrar do Honeyde e da honra que tive em privar da sua atenção e amizade.

Onde quer que estejas... num concerto celestial... todos se calam para ouvir tua voz e escutar a tua gaita.

Campo Grande, 11 de março de 2015.

Odilon Garcez Ayres
Membro da APL – RS e ALB-MS