Como no dia 16, sábado, acontecerá o acendimento oficial da Chama Crioula, na cidade de Cruz Alta, vamos postar, em três partes (hoje, amanhã e depois) um belo trabalho de pesquisa cultural do tradicionalista Rogério Bastos sobre o tema. Gracias pela "mão", amigo Rogério.
A Chama Crioula - Parte I
Tomaz Schuch e Léo Ribeiro rondando a Chama numa madrugada fria de 2013
O domínio do fogo
A partir do domínio do fogo, o cérebro humano desenvolveu-se muito
rapidamente, proporcionando um salto qualitativo na nossa vida. A
sociedade humana, como a conhecemos, acredita-se que se estruturou a
partir do momento em que o homem passou a dominar o fogo, pois este
permitiu inúmeros avanços, dentre os quais, que os grupos familiares
estivessem ativos durante a noite, o preparo de alimentos e bebidas,
também foi usado em caçadas e para afugentar animais e grupos rivais.
Mas um ponto fundamental foi seu uso na agricultura e pecuária, servindo
para limpeza de áreas (sistema de coivara) e foi amplamente empregado
na fundição de metais.
O simbolismo do fogo
São inúmeros os registros que mostram a importância do fogo na vida do
homem. É um elemento que consome, aquece, ilumina, mas também pode
trazer morte e dor, e por isso, seu simbolismo pode variar muito
dependendo do contexto em que ele é usado.
O
fogo é um dos quatro elementos da natureza (água, terra, fogo e ar) e
que o ser humano pode produzir, fazendo uma conexão entre os homens e
Deuses. A maioria dos rituais, ao longo da história, envolve uma chama
eterna, e acender um fogo é equiparado com o nascimento e ressurreição. É
um princípio criador por excelência, símbolo da energia vital, da
purificação, da espiritualidade, do entusiasmo e do ardor.
A chama Crioula – Momento sociopolítico
O Brasil, no final dos anos 40, do século XX, estava saindo da ditadura
da chamada “Era Getúlio Vargas”, que havia calado a imprensa, que
prejudicava o desenvolvimento e prática das culturas regionais. Com
isso, perdeu-se o sentimento de culto à regionalidade. As raízes
regionais estavam em processo de esquecimento, adormecidas, reflexo da
proibição de demonstrações de valores de cada um dos estados. Bandeiras e
hinos dos estados foram, simbolicamente, queimados em cerimônia no Rio
de Janeiro e, diante de tudo isso, os gaúchos estavam acomodados àquela
situação, apáticos e sem iniciativa.
Liderados
pelo jovem João Carlos D’Avila Paixão Cortes, jovens estudantes do
Colégio Júlio de Castilhos, criam um departamento de tradições gaúchas,
que tinha a finalidade de preservar as tradições e o campeirismo do
estado, mas também desenvolver e proporcionar uma revitalização da
cultura rio-grandense, interligando-se e valorizando-a no contexto da
cultura brasileira.
Dentro deste espírito é que surge a criação da Ronda Crioula, que foi
do dia 7, com a extinção da pira da pátria, até o dia 20 de setembro, as
datas mais significativas para os gaúchos.
Paixão solicitou a Liga de Defesa Nacional para fazer a retirada de uma
centelha do "Fogo Simbólico da Pátria" para transformá-la em "Chama
Crioula", como símbolo da união indissolúvel do Rio Grande à Pátria Mãe,
e do desejo de que a mesma aquecesse o coração de todos os gaúchos e
brasileiros, até o dia 20 de setembro, data magna estadual.
Nessa oportunidade, Paixão recebeu o convite para montar uma guarda de
honra ao general farrapo, David Canabarro, que seria transladado de
Santana do Livramento para Porto Alegre. Então, Paixão reuniu um piquete
de oito gaúchos bem pilchados e, no dia 5 de setembro de 1947,
prestaram a homenagem a Canabarro.