Jamais o tipo clássico
do gaúcho superior esteve tão bem representado na chefia do executivo do Rio
Grande do Sul como no período de 1930 a 1937, quando José Antonio Flores da
Cunha foi sucessivamente interventor federal e governador. Filho de Sant'Ana do
Livramento, do sangue castelhano herdou a valentia, a eloquência, o gosto por
emoções fortes, a generosidade, a rebeldia, o espírito alegre, apaixonado e
sedutor. Se acrescentarmos outros atributos pessoais como a razoável cultura,
inteligência aguda, capacidade de liderança, teremos os ingredientes para
compreender o fascínio que exerceu sobre todos com quem conviveu.
A margem dos
acontecimentos históricos relacionados com ele, há fatos engraçados e
pitorescos, bastante ilustrativos e caracterizadores da época. Alguns destes causos retiramos do livro Anedotário da Rua da Praia, Vol. 2, de Renato Maciel de Sá Junior, Editora Globo, e vamos repassar, paulatinamente, aos nossos leitores:
1 - As divergências entre Getúlio Vargas e Flores da Cunha acentuavam-se rapidamente naquele segundo semestre de 1937. Flores, governador desde 1935, vivia em permanente exasperação, e quem sofria eram os subalternos do palácio. Certo fim de manhã, apareceu para visitá-lo seu amigo e deputado federal João Carlos Machado, figura espirituosa e simpática, a quem os assessores pediram para alegrar o chefe. Quando Machado entrou Flores foi direto ao assunto:
- Quais são as novidades?
- Novidades, general? Pois olha, acabo de assistir um fato muito contristador. Não é que, justamente quando o gringo jardineiro do palácio estava urinando lá nos fundos, apareceu um marimbondo e picou o membro do coitado? Levaram-no berrando de dor para o pronto-socorro, junto com sua mulher. Antes de atendê-lo o médico procurou acalmar a esposa: "A senhora não se preocupe, com uma injeção a dor passa logo". Quando o doutor ia saindo a italiana segurou-o pelo braço e pediu com os olhos brilhando: "doutore, vou lhe fazer um pedido; tire a dor mas, per favore, no tire o inchume!".