A PRESERVAÇÃO DA
IDENTIDADE CULTURAL
Todos sabem, mas nunca é demais
repetir, que a nossa identidade cultural passou a ser revitalizada pelo “Grupo
dos Oitos” ao final da segunda grande guerra, tendo como motivo basilar a
invasão de valores do povo da América do Norte, via televisão, revistas e
principalmente cinema. O Brasil estava sendo aculturado massiva e
inconscientemente por costumes sociológicos alheios ao chão nativo. Isto sem
falar nas barreiras impostas aos pendores naturais de cada Estado, na ditadura
Vargas.
Hoje, sete décadas após, o ciclo
se fecha e o perigo da unificação das culturas se manifesta através da
globalização, via internet.
Mas o que me assusta, é que esta
padronização não está tão longe assim de nós, gaúchos, como parece. Basta ver que a
outrora bela e pura cultura caipira (e mesmo a sertaneja), quase que evaporou-se
do Estado de São Paulo apesar dos esforços de pessoas como Inezita Barroso, Monteiro
Lobato, Cornélio Pires, Mazzaropi, o pintor Almeida Junior e outros que
pelearam pela preservação das raízes. Dos costumes caboclos, o pouco que ainda resta
são algumas minguadas Festas do Divino pelo interior paulista.
Musicalmente falando, a moda de
viola se arrasta e Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho, Pedro Bento e Zé
da Estrada, e outros da mesma estirpe, só vivem em nossa lembrança. Não
deixaram herdeiros. Os trabalhos autênticos perderam a queda-de-braço para o
rebolativo sertanejo universitário.
E quem desejar conhecer um típico
rodeio dos Estados Unidos, não precisa cruzar a América Central. Vá até
Barretos.
Poderíamos fazer igual citação a
outros Estados da Federação onde o rap, o funk, o raggae, e similares ditam as
regras nas “baladas”. O baião, o forró,
o frevo, estão tornando-se apenas uma mostra musical, uma forma de “conhecer
antes que morra”, para os turistas que visitam o nordeste.
Por estes e por outros motivos,
penso bem antes de elevar críticas a pessoas e entidades que vem cumprindo o
seu papel de guardiões dos rumos já definidos por quem estruturou nossa estampa
regional sul-brasileira, por quem tem compromissos com a autenticidade, e me
tapo de angústia com quem prega a diversidade cultural não com o intuito de
promover outras manifestações, mas com o fim de definhar aquela que recebemos
de nossos ancestrais.
Embora respeitando e valorizando os
hábitos de povos que migraram e ajudaram na formação de nosso Estado, o cerne
folclórico rio-grandense é aquele oriundo da influência do solo pampeano sobre
seus habitantes, ou seja, nós. Sim, pois nós temos história própria.
O mundo todo admira a preservação
dos costumes orientais. Como pode, em meio a progressista Tóquio, uma tradição
milenar manter-se autêntica, atrativa, e tão representativa?
É simples mas difícil.
As tradições japonesas, ou
russas, ou turcas, ou ciganas, enfim, mantém-se numa redoma que não permite a invasão
“alienígena” a qual começa com uma liberação aqui, outra ali, mais uma acolá, e
quando nos damos por conta tudo aquilo que é fidedigno, genuíno,
legítimo, lídimo, original, não existe mais. E aí não tem volta.
Sei que poderei
ser taxado de velho, antiquado, retrógrado, um homem fora do tempo, ao redigir
este texto. Mas não sou assim (apesar de uma certa idade). Vivo meu mundo, olho para a frente, viajo,
aprecio manifestações artísticas, sociais, lingüísticas e comportamentais de diversos
povos e por isto mesmo afirmo. Temos que viver intensamente o presente,
alicerçar o futuro, mas lutar com todas as armas na defesa da preservação do
passado, da história e da memória.
Poderia ter dedicado minha vida a tantas outras coisas mas preferi o rumo que irmana homem e cavalo, campo e cidade, vestido de prenda e bombacha. E ao fim de tudo reafirmo. Não me arrependo.
Nós somos ás águas
dos rios que passam e vão embora. A Tradição Gaúcha é o próprio rio, que é o
mesmo, que é perene, que tem nome e identidade. Não vamos mudar seu curso.